O dito popular afirma que não adianta chamar um cão de gato… Ele não há de miar.

Golpes de Estado não latem nem miam, mas fazem sangrar.

Sangram as instituições, depois as garantias fundamentais, e quando não interrompido, o evento caminha para uma hemorragia constitucional, quando a resistência passa a sangrar em termos pessoais.

Cidadãos são presos, torturados e mortos e em seguida, a verdade e a história também são esgarçadas, distorcidas e transformadas em um passado para consumo eleitoral.

Desde 2019, o Brasil passa por um momento de tentativa de conversão da ditadura histórica em ditadura mítica. Jair Bolsonaro e seu provável vice (Gen. Braga Neto) tentam eliminar o uso do termo ditadura (ditar de forma dura), substituindo-o por movimento.

Movimento é neutro: pode ser popular, democrático, pacífico (ou violento). Faz sentido que o movimento autoritário que governa o país tente reescrever o passado, alegando que não houve golpe porque este era um desejo da maioria. Não, não era.

Sim, havia quem defendia o golpe de 64, mas estes não eram maioria e não, não havia risco do país se tornar uma grande Cuba de língua portuguesa. A maioria da população desejava a manutenção da democracia e não poucos foram presos e mortos por isso. Existiam comunistas? Sim, em número ridiculamente pequeno e que não justificavam fechar o congresso e posteriormente revogar as garantias fundamentais pelo AI-5.

A ideia do atual governo brasileiro de celebrar um golpe de Estado como se fosse as algo bom, legítimo e aspirado pela maioria da população não passa do mesmo tipo de engodo que alega que vacinas causam AIDS, máscaras causam doenças e não existem queimadas criminosas na Amazônia.

O governo do “mito” só poderia desejar substituir o passado histórico pelo passado mítico.