Segundo Lyotard em sua magistral e sintética obra, A Condição Pós-Moderna, publicada em 1979, umas das marcas do fim da modernidade e início da era pós-moderna que adentramos é a guerra das narrativas, a morte da ciência como bússola da verdade e a adoção de modelos científicos que buscam apenas o desempenho em vez de respostas às questões cruciais ao cosmos.

Assim, sai o cientista como Newton que buscava a equação para a beleza do universo e entra o bilionário como Jobs que pretendia oferecer um smartphone com belo layout e super veloz. Foram, portanto, com essas conclusões, muito bem delineadas e certamente decorrentes de uma mente afiada que conseguiu antever com brevidade o que as décadas seguintes proporcionariam em termos de debates, que o filósofo francês abriu e fechou seu livro.

Passados 41 anos, observamos que as premissas de Jean-François se concretizaram até a enésima potência.

Expressivo número de parlamentares republicanos e seus seguidores nos EUA erigiram meses atrás uma cruzada contra as máscaras durante a pandemia do corona vírus. No Brasil, também tivemos nossos destaques: nosso Presidente não é um grande fã das máscaras e um proeminente Desembargador (juiz de segunda instância) vociferou vitupérios contra um guarda municipal na cidade de Santos, quando este instou-o utilizar a máscara em um passeio. A cena foi filmada e viralizou, gerou memes etc. Mas pasmem: há quem tenha ficado ao lado do desembargador, afinal, e a liberdade dele (contaminar outrem?)?

E agora foi a vez da Alemanha: maior potência cultural, econômica e tecnológica do velho continente, governada por uma líder cientista e moderada como Angela Merkel, a nação tedesca não escapou às ações dos polemistas: neste final de semana, imensas passeatas bailaram pelos espaços públicos com grande pauta de protestos, entre eles, a obrigatoriedade de uso de máscaras em espaço público, o que segundo os manifestantes, violaria a liberdade individual do cidadão.

Não parece relevante debater a eficiência ou ineficiência das máscaras segundo tecidos, tecnologias, modelos ou ocasiões: no meio de uma pandemia que contaminou 25 milhões de pessoas (até hoje) e ceifou a vida de quase 1 milhão de pessoas (o dobro, por exemplo, de genocídios como de Ruanda e dez vezes mais que a guerra da Bósnia), se negar a usar máscaras em espaços públicos não nos torna paladinos da liberdade, mas sim, aquele sujeito porco que utiliza o banheiro público e não puxa a descarga.