Direitistas quase sempre bradam o número de mortos causados pelo comunismo quando confrontados com os números das ditaduras latino americanas. Esquerdistas quase sempre invocam os números dos campos de concentração de Hitler da segunda guerra ou das bombas sobre Hiroshima e Nagasaki. A morte tem uma característica intrigante: quando ela é una, nos leva ao choque, ao luto, ao pranto, mas quando ela se repete, vai se tornando estatística, como já definia Stalin, um ás da morte coletiva, por assim dizer.

Se a morte estiver longe, ou seja, não tiver atingido um amigo, familiar ou conhecido, ela vai perdendo os contornos, é como se ao invés de rosto e forma humana, ela fosse alguns rabiscos em um relatório de um burocrata. Neste contexto, a morte migra de evento pertencente à vida para se tornar munição retórica. Na guerra de ideologias, atiram-se números de defuntos para todos os lados.

Para o contendor que acha que matou menos, não importa que matou: matou menos. Para o contendor que matou mais, não importa que matou mais, seu adversário também matou. O embate se torna uma verborragia genocida sem se atentar ao essencial: se morrer é da vida, será que era possível dar a quem se foi uma morte digna?

Pessoalmente, não me importa se serei enterrado em um cemitério verde e amarelo ou vermelho, mas gostaria que tratassem o meu cadáver, a minha família e os números que ele porventura representar, com mais dignidade que ser mera munição para pessoas cegas por ideologias atirarem umas nas outras.